Relatora da missão especial realizada pela Plataforma em Pernambuco apresentou dados do impacto da tríplice epidemia sobre direitos humanos das mulheres em sessão da CIDH no Uruguai

Em audiência sobre o vírus Zika e os direitos humanos das mulheres e das pessoas com descapacidade na América Latina e Caribe, ocorrida nesta semana durante o 165º Período de Sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em Montevidéu, a relatora da Plataforma Dhesca Brasil Beatriz Galli apresentou à relatora Especial de Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DESC) da CIDH, Soledad Garcia Muñoz, à Relatora sobre os Direitos da Infância, Esmeralda Arosemena de Troitiño, à Relatora sobre os Direitos das Mulheres, Margarette May Macaulay e ao Relator para direitos de pessoas com descapacidade, Luis Ernesto Vargas Silva, o relatório especial lançado pela Plataforma brasileira que contém informações sobre a tríplice epidemia de arboviroses e violações de direitos humanos em Pernambuco.

Representando a Plataforma Dhesca e a organização não-governamental Ipas, Galli descreveu o cenário do impacto da infecção dos arbovírus zika, chikungunya e dengue sobre as mulheres brasileiras, que revela a magnitude de problemas socioambientais como a falta de acesso a saneamento básico e de agua potável em determinadas regiões do país– e que, em um contexto de múltiplas formas de discriminação interseccional baseadas em gênero, raça e classe social, contribuíram para a ocorrência de uma epidemia tripla.

Em sua exposição, ela denunciou que profissionais de saúde nas regiões mais afetadas do Brasil não receberam, durante a epidemia, capacitação para o aconselhamento de mulheres durante o período pré-natal sobre os riscos para a gravidez e o desenvolvimento fetal, e que o foco principal foi a eliminação do vetor e na responsabilidade individual das mulheres e comunidades pela prevenção. “Esta situação demonstra a inexistência de políticas de saúde que garantam a tomada de decisão informada e o direito das mulheres decidirem sobre seus projetos de vida”, apontou.

Galli apresentou, ainda, dados da Plataforma Dhesca Brasil coletados na missão especial realizada em Pernambuco (saiba mais abaixo) que apontam que a maioria das famílias afetadas pela tríplice epidemia são de camadas populares e vive em situação de pobreza em locais sem saneamento básico e agua potável. “As mulheres informaram que o benefício social disponível pelo governo não é suficiente para a compra de medicamentos, fraldas e outras necessidades das crianças. A maioria das crianças afetadas sofre com problemas respiratórios e disfagias que causam dificuldade de deglutição e acarretam a necessidade de leites e suplementos nutricionais especiais, vários tipos de medicamentos especiais anti-convulsivos e acesso a procedimentos cirúrgicos para colocação de sondas gástricas”, denunciou, relatando também as dificuldades enfrentadas pelas mães em relação aos cuidados com as crianças – como a dificuldade de transporte e a insuficiência de terapias e instituições adequadas.

Em sua denúncia, Galli também reportou que o Estado brasileiro vem descumprindo sistematicamente com suas obrigações internacionais de direitos humanos, “em particular os direitos a saúde sexual e reprodutivo e direitos econômicos sociais e culturais”.

“Solicitamos que a CIDH inclua esse tema nos seus relatórios sobre os países e que a Relatoria de Dhesca faça um apelo aos Estados para informar sobre as medidas e respostas com enfoque de direitos humanos e igualdade de gênero que vêm sendo tomadas para a proteção das mulheres e comunidades mais afetadas em matéria de saúde e educação”, completa.

Relatoria

O objetivo da Relatoria, que teve início em abril deste ano e lançada no início deste mês, foi investigar os impactos da política econômica adotada pelo governo brasileiro no último período na violação dos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais da população, e também no acirramento das desigualdades econômicas e sociais no país – em especial àquelas referentes a gênero, raça, campo/cidade, geracionais e entre regiões do país.

Os temas abordados nas missões (ou visitas) realizadas pela Plataforma Dhesca e parceiros foram a violência nas favelas cariocas; a população em situação de rua e desempregada em São Paulo; a situação de abandono e criminalização enfrentada pelos povos indígenas de todo o país; o desmonte da política nacional de saúde, de saneamento e de assistência social em Pernambuco e o retrocesso das políticas agrárias aliado ao crescimento vertiginoso da violência no campo em Goiás.

Durante o processo das missões, foram coletados depoimentos, realizadas reuniões e ouvidos gestores públicos, além de especialistas, integrantes do sistema de justiça e movimentos sociais. As informações das missões integram um relatório nacional, composto também por análises de indicadores sociais e orçamentários, discussões jurídicas e econômicas e por recomendações ao poder público.

Plataforma Dhesca

A Plataforma de Direitos Humanos Dhesca Brasil é uma rede formada por 40 organizações e articulações da sociedade civil, que desenvolve ações de promoção e defesa dos direitos humanos, bem como na reparação de violações de direitos. Foi responsável pelo Brasil ter sido o primeiro país do mundo a criar, em 2002, Relatorias Nacionais de Direitos Humanos.

CIDH

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) encarregado da promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano. É integrada por sete membros independentes que atuam de forma pessoal e tem sua sede em Washington, D.C. Foi criada pela OEA em 1959 e, juntamente com a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH), instalada em 1979, é uma instituição do  Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos (SIDH).

O propósito das audiências temáticas é receber informações sobre a situação de direitos humanos relativos a determinadas temáticas ou assuntos em países específicos, além de emitir recomendações para o respeito e fruição dos direitos humanos.